Haemig PD 2012 Ecologia dos Micos-leões. ECOLOGIA.INFO 34

Ecologia dos Micos-leões

Nota. Esse artigo online é continuamente atualizado e revisado logo que resultados de novas pesquisas científicas tornam-se disponíveis. Portanto, apresenta as últimas informações sobre os tópicos abordados.

As quatro espécies de mico-leão (Leontopithecus) são encontradas exclusivamente na Mata Atlântica brasileira. Lá, as espécies de mico-leão vivem separadas umas das outras, cada uma em um pequeno território. Neste artigo, veremos as diversas maneiras de interação desses primatas ameaçados de extinção com outros animais e plantas.

Distribuição

As quatro espécies de mico-leão estão distribuídas da seguinte maneira, de norte a sul:

Mico-leão-de-cara-dourada (Leontopithecus chrysomelas)
- Bahia

Mico-leão-dourado (Leontopithecus rosalia)
- Rio de Janeiro

Mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus)
- São Paulo

Mico-leão-de-cara-preta (Leontopithecus caissara)
- Paraná e pequena área adjacente do sudeste de São Paulo

Cada espécie é encontrada apenas em uma pequena parte do estado indicado como seu território. Isso ocorre porque grande parte da Mata Atlântica, habitat dos micos-leões, foi destruída.

Os poucos micos-leões sobreviventes vivem em fragmentos remanescentes da Mata Atlântica e, às vezes, em plantações adjacentes que têm bromélias e espécies de árvores que os micos-leões podem utilizar (Faria et al. 2007; Oliveira et al. 2010, 2011).

Hábitos Gerais

Os micos-leões são ativos durante o dia e dormem durante a noite. Vivem em grupos de dois a 11 indivíduos, sendo que um grupo tem, em média, de quatro a sete indivíduos (Baker et al. 2002). Normalmente, cada grupo defende um território diferente (Peres 1989b).

Os micos-leões vivem em florestas e passam a maior parte do tempo em árvores. Assim como os saguis, têm unhas em forma de garras que lhes permitem agarrar-se a troncos e galhos de árvores. Os micos-leões andam, correm e saltam como esquilos, usando as quatro patas.

Os micos-leões alimentam-se principalmente de frutos, insetos, pequenos vertebrados e ovos de aves (Lapenta et al. 2003). Em menor grau, alimentam-se também de néctar, flores, gomas e exsudatos de plantas, além de cipós. (Peres 1989a; Miller & Dietz 2005).

Os micos-leões têm especializações que lhes permitem caçar presas escondidas. Seus dedos e mãos alongados penetram em aberturas de troncos de árvores, bromélias e folhagem densa, de onde retiram presas escondidas (Miller & Dietz 2005).

Os filhotes de micos-leões (normalmente gêmeos) nascem de setembro a março, "um pouco antes do pico da disponibilidade de frutas e insetos ou durante esse período". (Di Bitetti & Janson 2000).

Frugivoria

Os micos-leões se alimentam de uma grande variedade de frutos silvestres. Um estudo feito na Reserva Biológica de Una, por exemplo, mostrou que os micos-leões-de-cara-dourada alimentaram-se de frutos de 79 espécies de 32 famílias de plantas diferentes (Raboy & Dietz 2004). Outro estudo realizado em Una mostrou resultados semelhantes: os frutos de 93 espécies de árvores foram usados como alimento (Oliveira et al. 2010).

Embora muitos tipos de frutos façam parte da dieta, alguns são consumidos com mais frequência. Em um estudo em que micos-leões-de-cara-dourada alimentaram-se de frutos de 71 espécies diferentes, sete espécies compunham mais da metade da dieta (57,1%) e 32 espécies (45%) foram consumidas uma só vez. (Cardoso et al. 2011).

Da mesma forma, os micos-leões pretos da Fazenda Rio Claro passaram 37% do tempo de alimentação comendo frutos de uma de três espécies: gerivá ou coqueiro tupi (Syagus romanzoffiana) (Mamede-Costa & Godoi 1998). Uma parte tão grande do tempo total de alimentação era dedicada a essa árvore porque se trata de uma espécie que dá frutos o ano todo, com pico na estação seca, quando os frutos das outras árvores frutíferas são escassos. Assim, o fruto dessa palmeira parece ser um recurso essencial para os micos-leões-pretos e pode ser um fator importante na sua sobrevivência nos "poucos e pequenos fragmentos onde existem hoje" (Mamede-Costa & Godoi 1998).

Embora frutos comerciais raramente façam parte da dieta, ocasionalmente veem-se grupos de micos-leões-dourados comendo bananas em plantações adjacentes às florestas onde vivem (Coimbra-Filho 1969).

Dispersão de sementes

Os micos-leões desempenham um papel ecológico importante, pois dispersam as sementes da maioria dos frutos que comem. Quando um mico-leão engole sementes, elas muitas vezes passam intactas por seu trato digestivo. Quando o mico-leão defeca, as sementes são depositadas em um local distante da árvore-mãe.

Ao realizar esse transporte, os micos-leões ajudam as árvores a espalhar suas sementes pela floresta tropical. Com sorte, algumas dessas sementes germinarão e, se sobreviverem, darão origem a grandes árvores (Passos 1997; Lapenta & Procópio-de-Oliveira 2009).

Cardoso et al. (2011) constataram que 80,4% das defecações dos micos-leões-de-cara-dourada continham sementes. Eles observaram micos-leões-de-cara-dourada engolindo frutos de 53 espécies e descobriram sementes de 40 (75,4%) dessas espécies nas defecações que encontraram. A maior parte das defecações (54,9%) continha sementes de uma única espécie. O número maior de espécies em uma única defecação foi três.

Em outro estudo, micos-leões-dourados alimentaram-se dos frutos de 97 espécies de árvores, engolindo as sementes de 76 espécies e cuspindo as sementes de 21 (Lapenta & Procópio-de-Oliveira 2008). As sementes das 76 espécies engolidas pelos micos-leões dourados foram encontradas nas suas fezes. Mais uma vez, a maior parte das defecações (89,6%) continha apenas uma espécie de semente, e uma única defecação nunca continha mais de três espécies.

A que distância das árvores frutíferas são dispersas as sementes? Um estudo revelou que micos-leões-de-cara-dourada dispersaram sementes a uma distância entre 22 e 781 metros da árvore-mãe, sendo que a maioria (61%) foi dispersa ao longo de 150 metros (Cardoso et al. 2011). Outro estudo mostrou que micos-leões-dourados dispersaram sementes a uma distância entre zero e 858 metros da árvore-mãe, com distância média de 105 metros (Lapenta & Procópio-de-Oliveira 2008).

A passagem das sementes pelo trato digestivo do mico-leão as afeta de modo a alterar a frequência de germinação?

Para responder a essas perguntas, Lapenta et al. (2008) compararam a germinação de sementes obtidas de defecações de micos-leões-dourados a sementes da mesma espécie retiradas de frutos frescos. Das 23 espécies testadas, sete apresentaram aumento da frequência de germinação após a passagem das sementes pelo trato digestivo dos micos-leões-dourados. Três espécies apresentaram o resultado oposto, ao passo que em 11 espécies não houve diferença.

Associação com Aves

Às vezes, veem-se aves seguindo os micos-leões. Um estudo feito na Bahia ao longo de três anos mostrou que 11 espécies diferentes de aves forrageavam em uma distância de até cinco metros dos micos-leões-de-cara-dourada (Hankerson et al. 2006). Diversas espécies de arapaçus e cochis (Dendrocolaptidae) e a chora-chuva-de-cara-branca (Monasa morphoeus) compunham 92,7% das observações.

Essas associações entre micos-leões-de-cara-dourada e aves normalmente consistem em uma única espécie de ave forrageando com um grupo de micos-leões. Em seguida, em ordem decrescente de frequência, vêm as associações envolvendo duas, três e quatro espécies. O número mais alto de espécies de aves vistas em associação com os micos-leões-de-cara-dourada durante o estudo de três anos foi quatro (Hankerson et al. 2006).

Conforme os micos-leões passam de uma bromélia a outra à procura de alimentos escondidos, eles muitas vezes trazem à superfície insetos e outros animais, que são então apanhados e comidos por arapaçus, cochis e choras-chuvas-de-cara-branca, que seguem de perto os micos-leões (Hankerson et al. 2006). Acredita-se, por consequência, que essa associação possa ser benéfica às aves, por aumentar seu acesso às presas que frequentemente não estão à sua vista.

O estudo de três anos também mostrou que a associação entre micos-leões-de-cara-dourada e aves ocorria o ano todo, sem diferenças significativas de frequência em diferentes estações do ano (Hankerson et al. 2006).

Seleção de Locais para Dormir

Os micos-leões normalmente dormem em ocos de árvores durante a noite. Às vezes, no entanto, podem dormir em bambuzais, emaranhados densos de cipós, abrigos naturais formados por bromélias, caules de palmeiras, sob folhas de palmeiras vivas ou mortas, ninhos abandonados de aves ou mamíferos e galhos ou ramos de árvores (Hankerson et al. 2007; Amaral Nascimento & Schmidlin 2011).

Um estudo feito ao longo de 14 anos mostrou as seguintes frequências de escolha de local para dormir por micos-leões-dourados: ocos de árvores = 63,6%; no solo, em bambuzais densos = 17,5%; emaranhados densos de cipós = 9,6%; bromélias = 4,7 % (Hankerson et al. 2007). Quando dormiam em árvores, a altura média era de seis ou mais metros acima do solo (Hankerson et al. 2007).

Por que os micos-leões estão ameaçados de extinção

As quatro espécies de mico-leão estão ameaçadas de extinção. A causa principal dessa ameaça é a destruição da Mata Atlântica pelos seres humanos. Os micos-leões precisam dessa floresta para sobreviver (Kierulff & Rylands 2003).

A captura ilegal de micos-leões para venda como animal de estimação é outro fator importante na queda do número de indivíduos (Kierulff & Rylands 2003).

Referências

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Informações sobre esse Artigo

Esse artigo também está disponível nas seguintes línguas:

inglês

Autor: Dr. Paul D. Haemig (PhD em Ecologia Animal) - Ecology Online Sweden.

Fotografia:  A foto no topo da página foi tirada por Joroen Kransen (Netherlands) e ilustra o mico-leão dourado (Leontopithecus rosalia).

A citação adequada é:

Haemig PD  2012    Ecologia dos Micos-leões.  ECOLOGIA.INFO 34

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