Diferenças no Uso do
Habitat
Ao longo
do rio Amazonas, há vastas
extensões de florestas tropicais de
planície que ficam alagadas pelo
rio entre 4 e 8 meses do ano. Essas florestas inundáveis geralmente são chamadas de
“florestas de várzea." Em maiores elevações (60 a 200 metros), as
florestas tropicais nunca sofrem inundação,
sendo portanto chamadas de
“florestas
de terra firme”
(Sick, 1993).
Na Amazônia,
as duas espécies
de pecarídeos
ocorrem em ambos os tipos de florestas, mas a queixada prefere florestas
de várzea, enquanto o cateto
prefere florestas de terra firme (Bodmer, 1990). Em ambas as florestas, a
queixada freqüenta habitats mais
úmidos do que o cateto
(Bodmer, 1991a).
Na Amazônia Peruana, as duas espécies de pecarídeos reagem de maneira
diferente
à inundação das florestas de várzea (Bodmer, 1990). As
queixadas que utilizam as florestas de várzea
extensivamente e distribuem-se em grandes extensões, reagem
à inundação ao migrarem para distantes
florestas de várzea,
porém não alteram a dieta.
Os
catetos, por sua vez, geralmente evitam as florestas de várzea e sua
área
é menor do que a das
queixadas. Esses relativamente poucos catetos que habitam as
florestas de várzea não migram durante as inundações, mas ficam presos em ilhas
mais elevadas no rio, onde comem mais folhas e menos frutas.
Na Reserva
da Biosfera de Calakmul, em Campeche, México, foram encontradas pegadas de
queixada apenas nas florestas médias subperenes, enquanto pegadas de
cateto foram vistas em três tipos de florestas proporcionalmente à
disponibilidade dessas diferentes florestas: (1) média subperene, (2)
baixa subperene sazonalmente inundada e (3) semi-decídua baixa
(Reyna-Hurtado e Tanner, 2005). Conseqüentemente, a queixada foi
considerada um especialista em habitats, enquanto o cateto foi considerado
um generalista.
Nas áreas
fora da Reserva de Calakmul, contudo, as florestas médias subperenes eram
utilizadas extensivamente pelos humanos para a caça e colheita de chicle,
madeira, castanhas de palmeiras e mel. Nessas áreas, encontrou-se cerca de
metade das pegadas de queixada em florestas médias subperenes e metade em
florestas subperenes baixas inundadas sazonalmente (Reyna-Hurtado e
Tanner, 2005). Em contrapartida, a freqüência das pegadas de cateto nas
florestas médias subperenes aumentou (Reyna-Hurtado e Tanner, 2005).
Encontros entre espécies de pecarídeos
O que
acontece quando os catetos encontram seus parentes maiores, as queixadas?
Na Mata Atlântica do Brasil, Keuroghlian et al. (2004) registraram 9
ocorrências de encontros de manadas de catetos com submanadas de
queixadas. Em cada caso, "minutos após os encontros”, os catetos
“rapidamente deixavam a área onde as queixadas estavam entrando”.
Esses
resultados são compatíveis com o estudo mexicano citado acima, no qual
rastros de catetos eram vistos mais freqüentemente em florestas médias
subperenes após a redução do uso dessas florestas pelas queixadas
(Reyna-Hurtado e Tanner, 2005).
Referências
Altrichter M, Boaglio
GI (2004) Distribution and relative abundance of peccaries in
the Argentine Chaco: associations with human factors. Biological
Conservation 116: 217-225
Barreto GR, Hernandez
OE, Ojasti J (1997) Diet of peccaries (Tayassu tajacu and
T. pecari) in a dry forest in Venezuela. Journal of the
Zoological Society of London 241: 279-284
Beck H (2006)
A review of peccary-palm interactions and their ecological ramifications
across the Neotropics. Journal of Mammalogy 87: 519-530
Bodmer RE (1990)
Responses of ungulates to seasonal inundations in the Amazon floodplain.
Journal of Tropical Ecology 6: 191-201
Bodmer RE (1991a)
Influence of digestive morphology on resource partitioning in Amazonian
ungulates. Oecologia 85: 361-65.
Bodmer RE (1991b)
Strategies of seed dispersal and seed predation in Amazonian ungulates.
Biotropica 23: 255-261
Cullen L, Bodmer RE,
Valladares-Pádua C (2000) Effects of hunting in habitat
fragments of the Atlantic forest, Brazil. Biological Conservation
95: 49-56
Emmons LH
(1997) Neotropical Rainforest Mammals: a field guide; Second edition.
University of Chicago Press, USA
Keuroghlian A, Eaton
DP, Longland WS (2004)
Area use by white-lipped and collared
peccaries (Tayassu pecari and Tayassu tajacu) in a tropical
forest fragment. Biological Conservation 120: 411-425
Keuroghlian A, Eaton DP
(2008) Fruit availability and peccary frugivory in an isolated Atlantic
Forest fragment: Effects of peccary ranging behavior and habitat use.
Biotropica 40: 62-70
Kiltie RA (1981)
Stomach contents of rain forest peccaries (Tayassu tajacu and T.
pecari). Biotropica 13: 234-236
Kiltie RA (1982) Bite
force as a basis of niche differentiation between rain forest peccaries (Tayassu
tajacu and T. pecari). Biotropica 14: 188-195
Kiltie RA, Terborgh J
(1983) Observations on the behavior of rain forest peccaries in Peru: Why
do white-lipped peccaries form herds? Zeitschrift für Tierpsychologie
62: 241-255
Olmos F (1993) Diet
of sympatric Brazilian caatinga peccaries. Journal of Tropical Ecology
9: 255-258
Peres CA (1996)
Population status of white-lipped and collared peccaries in hunted and
unhunted Amazonian forests. Biological Conservation 77: 115-123.
Reyna-Hurtado R, Tanner
GW (2005) Habitat preferences of ungulates in hunted and nonhunted areas
in the Calakmul Forest, Campeche, Mexico. Biotropica 37: 676-685
Robinson JG, Eisenberg
JF (1985) Group size and foraging habits of the collared peccary (Tayassu
tajacu). Journal of Mammalogy 66: 153-155
Sick H (1993)
Birds in Brazil. Princeton University Press, USA
Silvius KM (2002)
Spatio-temporal patterns of palm endocarp use by three Amazonian forest
mammals: granivory or 'grubivory'? Journal of Tropical Ecology 18:
707-723
Sowls LK (1997)
Javelinas and other peccaries. Texas A&M University Press, College
Station
Taber AB, Altrichter M,
Beck H, Gongora (2011) Family Tayassuidae (Peccaries). Pp 292-307 in
Handbook of the Mammals of the World, Volume 2: Hoofed Mammals. Lynx
Edicions, Barcelona
Informações
sobre esse Artigo
Esse
artigo
também
está disponível nas seguintes línguas:
espanhol
inglês
Fotografia: O cateto (Pecari tajacu), Parque Nacional Big Bend,
Texas.
Foto de Sue Reilly (Estados Unidos da América).
Autor:
Dr. Paul D. Haemig (Suécia).
A
citação adequada é:
Haemig PD
2011
Queixada
e Cateto Simpátricos.
ECOLOGIA.INFO 10
Caso você tenha conhecimento sobre publicações científicas importantes que
foram omitidas nesse artigo ou queira dar sugestões para melhorá-lo, entre
em contato com o autor por e-mail:
haemig@ecology.info
©
Copyright 2002-2011
Ecology Online Sweden. Todos os direitos reservados.
|